segunda-feira, 31 de março de 2014

50 ANOS DO GOLPE MILITAR


Para que Jamais esqueçamos e jamais se repita. O balanço da violência institucional do golpe.

Lista dos 362 mortos e desaparecidos políticos da Ditadura de 64

Abelardo Rausch de Alcântara, Abílio Clemente Filho, Aderval Alves Coqueiro, Adriano Fonseca Filho, Alberto Aleixo, Alceri Maria Gomes da Silva, Aldo de Sá Brito Souza Neto, Alex de Paula Xavier Pereira, Alexander José Voeroes Ibsen, Alexandre Vannuchi Leme, Alfeu de Alcântara Monteiro, Almir Custódio de Lima, Aluizio Palhano Pedreira Ferreira, Alvino Ferreira Felipe, Amaro Felix Pereira, Amaro Luiz de Carvalho, Ana Maria Nacinovic Corrêa, Ana Rosa Kucinski Silva, Anatália de Souza Melo Alves, Andre Grabois, Ângelo Arroyo, Ângelo Cardoso da Silva, Antogildo Pascoal Viana, Antônio Alfredo de Lima (consta do anexo da lei como Antônio Alfredo de Campos), Antônio Araújo Veloso, Antônio Bem Cardoso, Antônio Benetazzo, Antônio Carlos Bicalho Lana, Antônio Carlos Monteiro Teixeira, Antônio Carlos Nogueira Cabral, Antônio de Padua Costa, Antônio dos Três Reis de Oliveira, Antônio Ferreira Pinto, Antônio Guilherme Ri- beiro Ribas, Antônio Henrique Pereira Neto (padre), Antônio Joaquim de Souza Machado, Antônio José dos Reis, Antônio Marcos Pinto de Oliveira, Antônio Raymundo de Lucena, Antônio Sérgio de Mattos, Antônio Teodoro de Castro, Arildo Airton Valadão, Armando Teixeira Fructuoso, Arnaldo Cardoso Rocha, Arno Preis, Ary Abreu Lima da Rosa, Augusto Soares da Cunha, Áurea Eliza Pereira, Aurora Maria Nascimento Furtado, Avelmar Moreira de Barros, Aylton Adalberto Mortati, Benedito Gonçalves, Benedito Pereira Serra, Bergson Gurjão Farias, Boanerges de Souza Massa, Caiupy Alves de Castro, Carlos Alberto Soares de Freitas, Carlos Antunes da Silva, Carlos Eduardo Pires Fleury, Carlos Lamarca, Carlos Marighella, Carlos Nicolau Danielli, Carlos Roberto Zanirato, Carlos Schirmer, Cassimiro Luiz de Freitas, Catarina Helena Abi-Eçab, Célio Augusto Guedes, Celso Gilberto de Oliveira, Chael Charles Schreier, Cilon Cunha Brum, Ciro Flávio Salazar de Oliveira, Cloves Dias Amorim, Custódio Saraiva Neto, Daniel José de Carvalho, Daniel Ribeiro Callado, Darcy José dos Santos Mariante, David Capistrano da Costa, David de Souza Meira, Denis Casemiro, Dermeval da Silva Pereira, Devanir José de Carvalho, Dilermano Melo do Nascimento, Dimas Antônio Casemiro, Dinaelza Santana Coqueiro, Dinalva Oliveira Teixeira, Divino Ferreira de Souza, Divo Fernandes D’ Oliveira, Dorival Ferreira, Durvalino Porfirio de Souza, Edgar de Aquino Duarte, Edmur Péricles Camargo, Edson Luiz Lima Souto, Edson Neves Quaresma, Edu Barreto Leite, Eduardo Antônio da Fonseca, Eduardo Collier Filho, Eduardo Leite, Eiraldo de Palha Freire, Elmo Correa, Elson Costa, Elvaristo Alves da Silva, Emmanuel Bezerra dos Santos, Enrique Ernesto Ruggia, Epaminondas Gomes de Oliveira, Eremias Delizoicov, Esmeraldina Carvalho Cunha, Eudaldo Gomes da Silva, Evaldo Luiz Ferreira de Souza, Ezequias Bezerra da Rocha, Felix Escobar, Fernando Augusto da Fonseca, Fernando Augusto de Santa Cruz Oliveira, Fernando da Silva Lembo, Flavio Carvalho Molina, Flávio Ferreira da Silva, Francisco das Chagas Pereira, Francisco Emmanuel Penteado, Francisco José de Oliveira, Francisco Manoel Chaves, Francisco Seiko Okama, Francisco Tenório Cerqueira Júnior, Frederico Eduardo Mayr, Gastone Lúcia de Carvalho Beltrão, Gelson Reicher , Geraldo Bernardo da Silva, Geraldo da Rocha Gualberto, Gerson Theodoro de Oliveira, Getulio de Oliveira Cabral, Gilberto Olímpio Maria, Gildo Macedo Lacerda , Grenaldo de Jesus da Silva, Guilherme Gomes Lund, Gustavo Buarque Schiller, Hamilton Fernando Cunha, Hamilton Pereira Damasceno, Helber José Gomes Goulart, Hélcio Pereira Fortes , Helenira Resende de Souza Nazareth , Heleny Ferreira Telles Guariba , Helio Luiz Navarro de Magalhães, Henrique Cintra Ferreira de Ornellas , Higino João Pio, Hiran de Lima Pereira, Hirohaki Torigoe, Honestino Monteiro Guimarães, Horacio Domingo Campiglia, Iara Iavelberg, Idalisio Soares Aranha Filho, Ieda Santos Delgado, Inocêncio Pereira Alves, Isis Dias de Oliveira, Ismael Silva de Jesus , Israel Tavares Ro- que, Issami Nakamura Okano, Itair José Veloso, Iuri Xavier Pereira, Ivan Mota Dias, Ivan Rocha Aguiar, Jaime Petit da Silva, Jana Moroni Barroso, Jarbas Pereira Marques , Jayme Amorim de Miranda, Jeová Assis Gomes, João Alfredo Dias, João Antônio Santos Abi-Eçab, João Batista Franco Drumond, João Batista Rita, João Bosco Penido Burnier, João Carlos Cavalcanti Reis, João Carlos Haas Sobrinho , João Domingues da Silva, João Gualberto Calatrone, João Leonardo da Silva Rocha, João Lucas Alves, João Massena Melo, João Roberto Borges de Souza, Joaquim Alencar de Seixas, Joaquim Câmara Ferreira, Joaquim Pires Cerveira, Joel José de Carvalho, Joel Vasconcelos Santos, Joelson Crispim , Jonas José de Albuquerque Barros, Jorge Aprígio de Paula, Jorge Leal Gonçalves Pereira, Jorge Oscar Adur, José Bartolomeu Rodrigues de Souza, José Campos Barreto, José Carlos Novaes da Mata Machado, José Dalmo Guimarães Lins, José de Lima Piauhy Dourado, José de Souza, José Gomes Teixeira, José Guimarães, José Huberto Bronca, José Idésio Brianezi, José Inocêncio Barreto, José Isabel do Nascimento, José Júlio de Araújo, José Lavecchia, José Manoel da Silva, José Maria Ferreira de Araújo, José Maurilio Patricio, José Maximino de Andrade Netto, José Mendes de Sá Roriz, José Milton Barbosa, José Montenegro de Lima, José Porfirio de Souza, José Raimundo da Costa, José Roberto Arantes de Almeida, José Roberto Spiegner, Jose Roman, José Silton Pinheiro, José Toledo de Oliveira, José Wilson Lessa Sabbag, Juan Antônio Carrasco Forrastal, Juarez Guimarães Brito, Kleber Lemos da Silva, Labibe Elias Abduch, Lauriberto José Reyes, Leopoldo Chiapetti, Líbero Giancarlo Castiglia, Lígia Maria Salgado Nóbrega, Lincoln Bicalho Roque, Lincoln Cordeiro Oest, Lorenzo Ismael Viñas, Lourdes Maria Wanderley Pontes, Lourenço Camelo de Mesquita, Lourival Moura Paulino, Lúcia Maria de Souza, Lucimar Brandão Guimarães, Lucindo Costa, Lúcio Petit da Silva, Luiz Almeida Araújo, Luiz Antônio Santa Barbara, Luiz Carlos Augusto, Luiz Eduardo da Rocha Merlino, Luiz Eurico Tejera Lisbôa, Luiz Fogaça Balboni, Luiz Ghilardini, Luiz Gonzaga dos Santos, Luiz Hirata , Luiz Ignácio Maranhão Filho, Luiz José da Cunha, Luiz Paulo da Cruz Nunes, Luiz René Silveira e Silva, Luiz Vieira, Luiza Augusta Garlippe, Lyda Monteiro da Silva, Manoel Aleixo da Silva, Manoel Alexandrino, Manoel Alves de Oliveira, Manoel Custodio Martins, Manoel Fiel Filho, Manoel José Nunes Mendes Abreu, Manoel José Nurchis, Manoel Lisbôa de Moura, Manoel Raimundo Soares, Manoel Rodrigues Ferreira, Marcio Beck Machado, Marco Antônio Dias Baptista, Marcos Antônio Bráz de Carvalho, Marcos Antônio da Silva Lima, Marcos José de Lima, Marcos Nonato da Fonseca, Maria Augusta Thomaz, Maria Auxiliadora Lara Barcellos, Maria Célia Correa, Maria Lúcia Petit da Silva, Maria Regina Lobo Leite de Figueiredo, Mariano Joaquim da Silva, Marilene Villas Boas Pinto, Mário Alves de Souza Vieira, Mário de Souza Prata, Massafumi Yoshinaga, Mauricio Grabois, Mauricio Guilherme da Silveira, Merival Araújo, Miguel Pereira dos Santos, Miguel Sabat Nuet, Milton Soares de Castro, Monica Suzana Pinus Binstock, Nativo Natividade de Oliveira, Neide Alves dos Santos, Nelson José de Almeida, Nelson Lima Piauhy Dourado, Nestor Vera, Newton Eduardo de Oliveira, Nilda Carvalho Cunha, Norberto Armando Habegger , Norberto Nehring, Odijas Carvalho de Souza, Olavo Hansen, Onofre Pinto, Orlando da Silva Rosa Bomfim Junior , Orlando Momente , Ornalino Cândido da Silva, Orocilio Martins Gonçalves, Osvaldo Orlando da Costa , Otávio Soares da Cunha, Otoniel Campos Barreto, Pauline Philipe Reichstul, Paulo César Botelho Massa, Paulo Costa Ribeiro Bastos, Paulo de Tarso Celestino da Silva, Paulo Guerra Tavares, Paulo Mendes Rodrigues, Paulo Roberto Pereira Marques, Paulo Stuart Wright, Paulo Torres Gonçalves, Pedro Alexandrino de Oliveira Filho, Pedro Domiense de Oliveira, Pedro Inácio de Araújo, Pedro Jerônimo de Souza, Pedro Ventura Felipe de Araújo Pomar, Péricles Gusmão Régis, Raimundo Eduardo da Silva, Raimundo Gonçalves de Figueiredo, Raimundo Nonato Paz, Ramires Maranhão do Valle, Ranúsia Alves Rodrigues, Raul Amaro Nin Ferreira, Reinaldo Silveira Pimenta, Roberto Cietto, Roberto Macarini, Rodolfo de Carvalho Troiano, Ronaldo Mouth Queiroz, Rosalindo de Sousa, Rubens Beirodt Paiva, Rui Osvaldo Aguiar Pfutzenreuter, Ruy Carlos Vieira Berbert, Ruy Frasão Soares, Santo Dias da Silva, Sebastião Tomé da Silva, Sergio Landulfo Furtado, Severino Elias de Mello, Severino Viana Callôr , Solange Lourenço Gomes, Soledad Barret Viedma, Sônia Maria de Moraes Angel Jones, Stuart Edgar Angel Jones, Suely Yumiko Kanayama, Telma Regina Cordeiro Corrêa, Therezinha Viana de Assis, Thomaz Antônio da Silva Meirelles Netto, Tito de Alencar Lima*, Tobias Pereira Júnior, Uirassu Assis Batista, Umberto de Albuquerque Câmara Neto, Valdir Salles Saboia, Vandick Reidner Pereira Coqueiro, Virgilio Gomes da Silva, Vitor Carlos Ramos, Vitorino Alves Moitinho, Vladimir Herzog, Walkiria Afonso Costa, Walter de Souza Ribeiro, Walter Ribeiro Novaes, Wilson Silva, Yoshitane Fujimori, Zelmo Bosc, Zuleika Angel Jones.
O ano mais sanguinário foi o de 1972, no qual foram assassinados 61 patriotas, entre os quais, o meu amigo José Silton Pinheiro.
Além dessa violência física contra a vida, a ditadura cometeu inúmeras outras violências, que listo a seguir:
A violência Política:
1 – Deposição do Presidente eleito Constitucionalmente;
2 – Cassação de: 07 Governadores, 03 Vice-Governadores, 04 Ministros de Estado, 44 Prefeitos, 13 Vice-Prefeitos, 17 Secretários Executivos, 150 Deputados Federais, 25 suplentes de Deputados Federais, 230 Deputados Estaduais, 51 suplentes de Deputados Estaduais, 45 Vereadores e 35 Dirigentes Sindicais. Ao todo 624 cidadãos foram atingidos e banidos da vida pública.
3 – A Violência Jurídica:
A ditadura governou através de Atos Institucionais – AI
AI Nº 1 – Suspendeu as imunidades parlamentares;
AI Nº 2 – Extingue os partidos políticos e por Ato Complementar, de Nº 4 cria  a ARENA e MDB;
AI Nº 5 – O mais drástico. Suspende o Habeas Corpus, fecha o Congresso Nacional, censura a imprensa e implanta o terror de Estado. É o golpe dentro do golpe;
AI Nº 10 – Determina que as cassações acarretassem a perda dos cargos ou da função na administração direta ou indireta;
AI Nº 14 – Estabelece a pena de morte;
AI Nº 16 – Decreta a vacância da Presidência e Vice Presidência. Pedro Aleixo, então Vice-Presidente, é afastado e uma Junta Militar governa o Brasil enqunto dura a enfermidade de Costa e Silva.
4 – A Violência Cultural:
Foram proibidos 500 filmes;
450 peças de Teatro vetadas;
100 Revistas foram tiradas de circulação;
50 músicas foram censuradas e
200 livros censurados.

domingo, 30 de março de 2014

MEU ANIVERSÁRIO



 Compadre Alex,eu, Eró, Edna, Epamenondas, e Artagnam.

 Ana com Arthur, Val, Seu Alcimar e esposa.

 Thalita e o pai, seu Alcimar
 Mazé, Socorro, Lia, Iure, Alex, eu e Eró

 As bregas Ody e Jay, vestidas a caráter para o baile  brega do Emerson
 Eró, Jay, eu e Ody

Ontem, 29 de março de 2014, completei 66 voltas em torno do Sol, estrela de 5ª grandeza que fica na periferia da nossa Via Láctea e que daqui a, mais ou menos, 4 bilhões de anos irá explodir e engolir o nosso sistema solar com o nosso planeta no seu ventre de fogo. Até lá, iremos criar e recriar a vida e um mundo melhor no nosso planeta azul, que  precisa de tantos cuidados. Nossa casa cósmica  corre o risco de se acabar, antes do combinado, antes que o Sol agonize. Isso não podemos permitir. Que a morte venha de forma natural, como eu espero que seja a minha emplacando, pelo menos, um centenário, dando mais umas 34 voltas, ou um pouquinho mais, ao redor do nosso estrela.

O registro do jantar que a Eró preparou prá mim, os familiares e amigos mais chegados. Coisa simples: bobó de camarão, torta de frango, peixe ao molho de camarão e arroz branco. Tudo muito saboroso pois temperado com carinho. Gratidão à todos que me felicitaram.

sábado, 29 de março de 2014

FOI DADA A LARGADA




 Nilton e Angelim

Ontem na casa da Meire, foi dada a largada para a campanha eleitoral de Nilton Cosson para Deputado Estadual e Raimundo Angelim para Deputado Federal. São os candidatos nos quais vou votar e pedir votos. Como frisou o Senador Anibal, que estava presente ao evento, todos nós devemos dá o nosso testemunho sobre quem estamos escolhendo para nos representar. Testemunho junto a família, os amigos, os alunos e conhecidos. Meu primeiro testemunho. Voto no Nilton e no Angelim, primeiro porque só meus amigo e companheiros de partido e como disse  Carlos Imperial: "meus amigos não têm defeitos. Os inimigos se não tiver eu boto".


 Os apoiadores



Senador Anibal fazendo sua Saudação aos candidatos (disse que nunca perdeu um voto para estadual)

segunda-feira, 24 de março de 2014

COANDO AS MEMÓRIA - MINHAS LEMBRANÇAS DO GOLPE DE 64



Coando as Memórias
(Minhas lembranças do golpe de 64)
*Marcos Inácio Fernandes
 “Desconfiai do mais trivial,
na aparência singelo.
E examinai, sobretudo, o que parece habitual.
Suplicamos expressamente:
não aceiteis o que é de hábito
como coisa natural.
Pois em tempo de desordem sangrenta,
de confusão organizada,
de arbitrariedade consciente,
de humanidade desumanizada,
nada deve parecer natural.
Nada deve parecer impossível de mudar.”
(Nada É Impossível de Mudar – Bertolt Brechet)

Nesse ano da graça de 2014, muitas manifestações para rememorar o golpe político-militar de 1964, que completa 50 anos e, que por 21 anos, infelicitou o país, constituindo o período mais longo de uma ditadura no Brasil. As vivandeiras do golpe até promoveram uma nova “Marcha da Família com Deus” como em 64 e Bolsonaro protocolou, na Câmara dos Deputados, um pedido de uma sessão solene para rememorar e comemorar os 50 Anos da “Revolução” de março de 64. Como diria Marx,é a história se repetindo como farsa.
Com tantas manifestações acontecendo, algumas até extravagantes, como as que pedem o retorno dos militares, eu me atrevo a relatar e compartilhar a minha experiência com o golpe, que me alcançou no esplendor dos meus 16 anos, quando cursava o último ano do Ginásio (4ª série) no Ginásio Augusto Severo em Parnamirim-RN e não fazia a, mínima idéia, do que estava se desenrolando no país.
É necessário, entretanto, que retrocedamos um pouco no tempo para entender o que se passou em 64, embora esse texto não tenha nenhuma pretensão histórica, mas apenas de descrever as lembranças pessoais, as vivências, que a minha memória reteve, antes, durante e depois do golpe.
Remonto à 10 anos atrás. Em 1954, morava na ilha de Fernando Noronha, onde meu avô materno trabalhava como Diarista de Obra no destacamento da FAB (Força Aérea Brasileira) e meu pai, que era militar da Aeronáutica, serviu por alguns anos no pós-guerra. Naquele fatídico 24 de agosto, fui para a escola do Território (já estudava no 1º ano, apesar da minha tenra idade de 6 anos) e antes de entrarmos para as salas, formávamos no pátio e algum aluno hasteava a bandeira ao som do Hino Nacional executado em disco e cantado pelos alunos. Naquele dia não houve formatura e a bandeira já estava hasteada a meio pau, quando a diretora nos avisou, compungida, que não haveria aula em face da morte do Presidente Vargas. De volta a minha casa, o que me chamou atenção, foi a expressão comovida de meu avô ao pé do rádio ouvindo os boletins noticiosos do Repórter Esso (A Testemunha Ocular da História), que a todo instante entrava no ar. Aquela vinheta do Repórter Esso, até hoje, não me sai da cabeça. Com um tiro no seu próprio peito, Vargas “deixava a vida para entrar na história” e adiava o golpe em 10 anos.
Alguns anos depois houve outra tentativa de golpe, quando Jânio Quadros renunciou em 1961, e os militares tentaram impedir a posse do Vice-Presidente eleito, João Goulart. (Naquela época se votava, nominalmente, para vice - Presidente, tanto que Jango, que era da chapa do PTB/PDS, se elegeu com Jânio, que era da UDN. Foi a famosa dobradinha “Jan-Jan”). O que eu me lembro dessa época, foi que o então comandante da Base Aérea de Natal, coronel Burnier, que era um militar linha dura e com pendores golpistas, ( já havia participado do levante da Aeronáutica contra o governo de Juscelino em Aragarças em 1959), colocou todos os militares da Base de prontidão, que durou vários dias. Meu pai, que ainda estava na ativa, ficou muitos dias sem vir em casa. Burnier, que chegou a Brigadeiro, anos depois, seria protagonista de episódios dos mais infames do regime militar. Sob o seu comando no quartel da 3ª Zona Aérea no Rio de Janeiro, ocorreu a prisão e desaparecimento do ex – deputado, Rubens Paiva, a prisão e assassinato de Stuart Angel, ambos em 1971, e o rumoroso caso, de tentar usar a tropa de elite da Aeronáutica, o PARASAR, para cometer atentados terroristas no Gasômetro do Rio e seqüestrar opositores do regime para jogar no mar. Esse tresloucado ato só não se concretizou graças a reação do capitão do PARASAR, Sérgio Miranda de Carvalho ( o Sérgio Macaco), que não só descumpriu a ordem extravagante, como a denunciou a seu superiores, inclusive, ao Brigadeiro Eduardo Gomes. Em carta encaminhada ao Presidente Ernesto Geisel, relatando o fato, Eduardo Gomes, se referiu a Burnier como um “insano mental, inspirado por instintos perversos e sanguinários”.
Em 1964, o que ficou na memória dos primeiros dias do golpe foi o posicionamento de tropas do Exército em pontos estratégicos da cidade de Natal, durante os primeiros dias de abril. Lembro que quando fui assistir a um filme no cine Rio Grande, tinha uns sacos de areia e soldados com metralhadora perto do cinema. Não me recordo o filme que vi naquele dia, mas lembro que no jornal (me parece que o Canal 100), que antecedia o filme, mostrou o grande comício do dia 13 de março na Central do Brasil, onde Jango anunciou as Reformas de Base e ouriçou os golpistas. O golpe já havia acontecido e iria mergulhar o Brasil na sua ditadura mais prolongada e sanguinária. Naquela época eu não fazia a mínima idéia do que estava se passando e seguia, sem maiores preocupações, para a conclusão do ginásio.


O contexto do ano de 1964.
 Em 64, o Santos, com Pelé e companhia, sagrava-se bi-campeão Paulista vencendo a Portuguesa. No Rio, foi o Fluminense, que derrotou na final, o Bangu por 3X1. Na música, Baden Powell e Vinicius de Moraes, compunham Berimbau, dando início aos Afro Sambas e a uma das maiores parcerias da MPB. Silas de Oliveira compunha o samba enredo do Império Serrano, “Aquarela Brasileira”; Zé Keti, compunha, “Diz Que Fui Por Aí” e Nelson Cavaquinho, a sua antológica “Luz Negra”. Já no cancioneiro internacional, o sucesso do ano foi La Bamba e o bolero Encadenados (Acorrentados), que Lucho Gatica interpretava e que talvez profetizasse a situação em que mergulharia o Cone Sul (Brasil, Uruguai, Chile e Argentina) nas ditaduras mais sanguinárias – “um mundo de delírios” – como dizia o bolero.
Na cinematografia nacional, Glauber Rocha produzia o seu “Deus e o Diabo na Terra do Sol”, que se tornaria o marco do Cinema Novo e Ruy Guerra produzia “Os Fuzis”. Internacionalmente, era lançado o 2º ou 3º filme da série 007, o antológico “007 Contra Goldfinger”, que imortalizaria Sean Conery, com o melhor dos Bonds. Mas o filme de 1964, que é a cara do que aconteceu no Brasil, foi o Western de Sérgio Leone com Clint Eastwood, “Por Um Punhado de Dólares”. Aqui não foi só um punhado de dólares que os EEUU, investiu no golpe, foram milhões de dólares, fora as 6 malas cheias de dólares que o general Amaury Kruel, do II Exército de São Paulo, embolsou, conforme denúncia recente do Major do Exército Erimá Pinheiro Moreira, testemunha ocular do suborno milionário.
Minha experiência com a ditadura.
 No início dos 70, eu já havia concluído meu curso secundário na Escola Agro-técnica de Jundiaí em Macaíba – RN e já tinha uma certa compreensão do que estava ocorrendo no Brasil, onde o golpe dentro do golpe – o AI-5 – estava em pleno vigor . Mas a minha paixão era o futebol e jogar bola. Eu era um meio de campo que jogava até razoável (fui da seleção de Jundiaí e campeão do Interior pelo time de Parnamirim). Durante algum tempo  joguei pelo time do sítio de Japecanga,(um engenho de fogo morto) perto da minha cidade, Parnamirim. Foi nesse encontros futebolísticos, que conheci o Silton,( José Silton Pinheiro) que também jogava no time local.  
Na primeira vez, que estive em Japecanga, o que me chamou atenção foi o fato de um rapaz daquelas brenhas está assobiando músicas do Edu Lobo e Geraldo Vandré. Era o Silton. Após esse primeiro jogo, retornamos no caminhão do time de Natal e entabulamos conversa sobre as músicas que ele estava cantarolando. Informei-lhe que eu gostava da MPB e que escutava os programas de rádio de Irapuã Rocha, na Rádio Rural, e o de Rubens Lemos, na rádio Cabugi. O prefixo do programa do Rubens Lemos, dizia “Acorda samba do Brasil....”  Fiquei sabendo que ele ia fazer vestibular para Educação, que havia concluído o 2º grau no colégio Marista de Natal, que era do movimento estudantil e que havia sido criado por D. Lira, sua mãe adotiva. Na oportunidade lhe informei que também era secundarista e que estava pensando fazer Sociologia e ele, com o seu jeito expansivo e alegre, fêz a uma festa e me deu a maior força.
Desde então, ficamos amigos e freqüentávamos a casa um do outro. Continuamos a jogar no time de Japecanga. Em 1971, passamos no vestibular para as nossas áreas e a amizade evoluiu para um companheirismo partidário. Através do Silton eu pude enveredar pela trilha revolucionária que os jovens acalentam e acabei sendo “recrutado” para militar na FREP (Frente Revolucionária Popular), uma frente capitaneada pelo PCBR, no nordeste.
A minha militância “revolucionária” se restringiu a algumas leituras de textos clássicos da literatura socialista: O Manifesto Comunista, Esquerdismo: a Doença infantil do Comunismo, O Estado e a Revolução e romances do Jorge Amado: Subterrâneos da Liberdade, poesias de Brechet e Castro Alves e por aí. Através do Silton, tomei conhecimento do trabalho de Geanfrancesco Guarnieri, “Arena Canta Zumbi” e de “Liberdade, Liberdade” de Flávio Rangel e Millôr Fernandes. Esse trabalho teatral sobre a Liberdade já estava censurado, mas o Silton, ainda conseguiu comprar um LP e me presenteou. Guardo esse presente até hoje.  Agora, recentemente, já no século XXI,  consegui  esse trabalho em CD na coletânea  das duas coleções da Nara Leão, que na época participava do elenco da peça.
  As minhas ações “revolucionárias” se restringiram a duas panfletagens. Uma no cine Nordeste (jogar uns panfletos na parte de cima do cinema durante a projeção) e a outra dentro de um ônibus de linha que transportava trabalhadores nas primeiras horas da manhã de um bairro de Natal que eu não sabia qual era (tinha ido dormir no aparelho e de lá para o local da atividade, sempre de olhos vendados).
Na primeira semana de faculdade, na Fundação José Augusto, que oferecia os cursos de Sociologia e Jornalismo, recebi uma tarefa de me articular com Izolda, que também havia sido aprovada no curso, para formarmos uma célula de esquerda na faculdade. Mantivemos os primeiros contatos, mas, logo em seguida, (acho que com menos de 15 dias de curso), a Izolda foi presa quando soltava uns panfletos na fábrica de confecções Guararapes, na hora da saída das operárias. Izolda foi incursa na Lei de Segurança Nacional e pegou 2 anos de detenção, que cumpriu na Penitenciária João Chaves em Natal.
Fui com o Silton visitá-la algumas vezes e esse infortúnio proporcionou um romance/namoro entre Silton e Izolda e foi lá que conheci a Eró, irmã de criação da Izolda, com quem me casei em 1975 e vivo até hoje.  A possibilidade de ter conhecido essas pessoas (Silton, Izolda, Eró) foi a grande dádiva que o projeto ingênuo, mas generoso, da esquerda me presenteou e me moldou como ser humano (também ingênuo mas, da mesma forma, generoso).
Ainda através do Silton,  conheci Paulo Pontes, que esteve na minha casa participando de uma discussão com uma freira (não lembro mais o nome)  no nosso clube de jovens da Cohabinal. Depois da reunião com a irmã, fizemos uma discussão política, na qual, o Paulo Pontes disse que a alternativa no Brasil era “partir para luta armada”.
Eles partiram (Silton e Paulo) e pagaram caro por essa opção. Silton, com a vida, tirada da forma mais ignominiosa – a tortura, em 1972.** Paulo Pontes foi preso na Bahia, junto com Teodomiro dos Santos, mas ambos sobreviveram a tortura (sabe Deus com quais seqüelas). Tempos depois, em 1983, quando já morava no Acre, casado e com dois filhos (Ana e Abelardo) fui fazer um curso sobre Desenvolvimento Rural em Salvador e me reencontrei, nesse curso, com o Paulo Pontes. Ele havia feito o curso de Economia, que iniciou quando ainda estava preso. Depois de anistiado, concluiu o curso e trabalhava na CAR-BA. Reencontrei-o, bem mais velho e calvo, porém, vivo.
Silton,  foi para a clandestinidade e morreu por seus ideais.  Izolda, depois de cumprir sua pena, se auto-exilou no Peru e por lá casou e teve dois filhos, Jussara e Ernesto, ambos já formados, trabalhando e com filhos. Eu, que pretendia também entrar para a clandestinidade, fui preso em função de uma carta que havia enviado para Silton falando dessa minha pretensão. Na ocasião,  o Silton já havia sido assassinado e a carta  foi interceptada. Na noite de 10 de abril de 1973, ao retornar da Faculdade, quando estava chegando em casa, um jipe com dois policiais civis do DOPS, me levaram preso e me deixaram numa delegacia da Cidade da Esperança e depois fui para um depoimento no QG do Exército (hoje Museu Câmara Cascudo) e depois fui levado para a Polícia Federal.
Amarguei alguns dias na Polícia Federal, onde, logo que cheguei, levei uns sopapos de um policial, que chamavam de “Chinoca”.  Depois me encapusaram e algemaram e colocaram no piso do banco traseiro de uma Veraneio, com dois agentes com os pés no meu peito e me levaram para um local que desconheço.  Nesse local  passei por uma sessão de tortura, que se restringiu a telefones nos ouvidos, chutes e pancadas por todo o corpo, por algumas horas, além da tortura psicológica com ameaças de morte, de me enviarem para o Doi-Codi do Recife (ali eu ia ver o que era bom, diziam. Fiquei traumatizado só de ouvir a palavra RECIFE). Quando retornaram comigo para a Polícia Federal, já era noite. Estava arquejando com o corpo todo dolorido e o ouvido sangrava. Na ocasião um agente da PF foi comprar uma cerveja preta e me deu prá tomar. Foi um regalo. Esse agente me deu um conselho, que depois se tornou profético. Ele disse: “se eu fosse você quando saísse daqui, se sair, iria para o Acre”. Fiquei alguns dias na PF algemado a uma cama de campanha e incomunicável.  Apenas recebi a “visita” do tenente Albernáz do serviço de informação da Aeronáutica, que voltou a me fazer ameaças e falar mal dos comunistas, inclusive citando Prestes.
Depois de prestar vários depoimentos, fui processado pela Lei de Segurança Nacional e transferido para a Colônia Penal João Chaves. Nunca fiquei tão feliz em ir para um estabelecimento penal.  O meu receio e o meu pavor, era que me levassem para o Dói-Codi do Recife, como viviam me ameaçando, pois já tinha clareza de como funcionava os porões da ditadura.
Saí da prisão em 26 de junho de 1972. A 7ª Circunscrição da Justiça Militar em Recife, havia arquivado o meu processo e expediu meu alvará de soltura. Fiquei livre, mas, continuei perseguido por muito tempo. Toda vez que chegava um Presidente de plantão da ditadura em Natal, todos os fichados pelos órgãos de informações eram recolhidos no DOPS até a saída do Presidente. Fui vetado para um trabalho no IBGE no RN e aqui no Acre na UFAC, onde tempos depois entrei por concurso.
A vida seguiu. Casei em 75, me formei em 77 e vim para o Acre em 78 (a profecia do agente da PF se cumpriu). Aqui formei meus filhos estabeleci com minha esposa sólidas amizades, estabeleci boas relações e cheguei até, a ser autoridade (Secretário de Estado), graças ao projeto generoso da esquerda e do PT. E daqui só saio para a viagem grande. Mas,  como disse Millôr Fernandes: “É meu conforto – Da vida só me tiram morto”.   


*Marcos Inácio Fernandes, é professor aposentado da UFAC e militante do PT

** 1972 foi o ano em que a ditadura matou mais patriotas. Foram assassinadas 61 pessoas, entre as quais meu amigo e companheiro José Silton Pinheiro. Ao todo o regime militar torturou e matou 311 compatriotas.

quinta-feira, 20 de março de 2014

O ETERNO CAPITÃO






O meu eterno capitão, do Vasco e da Seleção Brasileira,  Hideraldo Luís Bellini, faleceu no dia de hoje. Foi compor a nossa zaga com Djalma Santos, Orlando e Nilton Santos em outros campos da eternidade. Descanse em paz, capitão.

sexta-feira, 7 de março de 2014

ERÓ SEIS PONTO OITO



 Eró (6.8), Arthur (a certeza de continuação de nossas vidas) e Marcos.

Não tem quem diga, mas hoje, Eró está completando 68 voltas em torno do sol com todas as suas estações (Primavera, verão, inverno e outono). Continua firme, forte e esbelta. Que todas as energias da natureza e do cosmos a conservem assim por muito tempo. Parabéns e felicidades, minha filha. São os votos de Marcos, Ana, Abelardo e, com certeza, do Arthur.

terça-feira, 4 de março de 2014

O CALENDÁRIO MARCA,,,


4 de março de 2014.

 Aniversário do Comandante Barca Furada, o mano Emanoel Rogério Fernandes, que nessa data completa 56 voltas em torno do sol. Parabéns e felicidades mano véio e vida longa. Será que vai ter um cuz-cuz peba hoje a noite?
 Rogério abre a temporada de natalícios da família FERNANDES. Dia 7 é o da Eró, e 29 o do dóia aqui.

Foto: Rosa, Rogério e Seu Jaime (Bruno) na lagoa do Carcará - Nísia Floresta - RN

QUE ESSE SONHO SE RENOVE !!



Sonho de Um Carnaval

Composição : Chico Buarque

Carnaval, desengano
Deixei a dor em casa me esperando
E brinquei e gritei e fui vestido de rei
Quarta-feira sempre desce o pano
Carnaval, desengano
Essa morena me deixou sonhando
Mão na mão, pé no chão
E hoje nem lembra não
Quarta-feira sempre desce o pano
Era uma canção, um só cordão
E uma vontade
De tomar a mão
De cada irmão pela cidade
No carnaval, esperança
Que gente longe viva na lembrança
Que gente triste possa entrar na dança

 Que gente grande saiba ser criança


O OSCAR VAI...

Para o filme: 12 Anos de Escravidão

 Compartilho esse texto do Urariano Mota sobre o filme e sua relação com o Brasil.

 Urariano Mota: 12 Anos de Escravidão e o Brasil
 publicado em 3 de março de 2014 às 13:19 por Urariano Mota, em Direto da Redação Recife (PE) -

 Mais de um crítico já observou que o filme 12 Anos de Escravidão, para historiadores norte-americanos, delimita um marco no conhecimento da escravidão. Falemos agora do que esse filme representa para os brasileiros. Na última sexta-feira, na fila do cinema aonde fui, não havia um só negro. Minto: havia só este mulato que agora escreve. Ao procurar outro na fila, recebi dos cidadãos de pele mais clara uns olhos envergonhados, que se baixavam até o chão. Tão Brasil. Tão brasileiro é o pudor educado para o que não se enfrenta. Mas o filme na tela nos pagaria. Lá, podemos ver o retrato da casa-grande: a indiferença de todos ante a tortura. Linda, a sinhá olha da varanda o negro ser torturado e nada vê, melhor, assiste ao espetáculo obsceno como uma liberalidade do senhor, o seu marido. Que aula. É um filme quase didático da infâmia, do que no Brasil está encoberto até hoje
. Para a nossa própria história, a do Nordeste do açúcar em especial, para o que não se destaca em Gilberto Freyre, para o que em Gilberto é prosa encantatória, a realidade no filme mostra um escravo na forca, pendurado por horas em uma árvore, enquanto a rotina da fazenda segue sem distúrbio, sem assaltos de horror ou de repulsa. Mas isso é tão Brasil, amigos. Hoje mesmo, aqui na minha cidade, na sua, jovens são amarrados em postes, os velhos pelourinhos. Os novos escravos são espancados, enquanto comunicadores na televisão aprovam e ganham dinheiro e fama por açular a massa para o linchamento. Se houvesse uma só imagem a destacar, eu destacaria a tortura de uma escrava sob o chicote. Por um lado, lembrei o comportamento da sobrevivência sob os torturadores na ditadura brasileira. Por outro, se fosse desenvolvida ao nível do real, do histórico, a cena daria vômitos pela agonia da dor, apesar de apenas representada.
 Porque a realidade é ainda mais cruel que o mostrado na tela. E os corações mais delicados, e hipócritas por extensão, se recusam a ver que os negros escravos no Brasil eram passados em moendas de cana, que expulsavam suas vísceras como bagaço. Outros, após o chicote, condenados à morte tinham as feridas abertas lambidos por bois. E aqui não preciso falar o quanto é áspera, cruel e ferina a língua de um boi. Poupemos o domingo. Mas de passagem menciono que negros eram ferrados no corpo como os quadrúpedes da fazenda. Eles não tinham a marca do dono por uma medalhinha, como aparece no escravo Salomon no filme. É estranho, é sintomático da crueldade brasileira, que os melhores relatos sobre a nossa escravidão (nossa aí em mais de um sentido, de falta de espírito liberto e de herança cultural) venham de estrangeiros, como os descritos em Charles Darwin e Vauthier, o engenheiro francês que viveu no Recife.

 De Vauthier cito: Madame Sarmento nos contou que como sua negrinha lhe tinha roubado seis vinténs, ela amarrou-lhe as mãos e deu-lhe umas boas chicotadas!!! Levantando- lhe a roupa!!! Sem nenhum constrangimento!!! Diante dos filhos!!! O mais velho deles observou que o posterior da negrinha não era mais bonito do que o de um cavalo, quando levanta a cauda. Qualquer pessoa poderia chegar a praticar coisas semelhantes num momento de excitação e envergonhar-se delas depois, mas contá-las… Que mulher! Que alma!… Hoje o cadáver de um negro ficou boiando na praia, debaixo das nossas janelas, levado e trazido pelas oscilações das marés. Mil pessoas passaram, viam-no, pararam um instante antes de seguirem caminho muito filosoficamente. Aprecio pouco as ideias geralmente admitidas sobre cadáveres que tendem em alguns casos a conceder mais cuidados aos despojos sem alma do que ao ser quando está vivo – mas este descaso, essa indiferença geral perante a morte – é verdade que era um negro! Um negro vivo já é pouca coisa: o que será então um negro morto? Essa incúria generalizada com as exalações que emanam de um cadáver, tudo isso caracteriza de modo bem saliente esta barbárie, engastada na selvageria e mal maquilada em civilização”.

 Saímos do cinema com uma frase do personagem na memória: “Eu sou a prova de que não existe justiça na terra”. Brancos, negros e mestiços de todas as cores bem compreendemos. Enquanto os miseráveis continuarem a ser presuntos, presidiários, enquanto não for vista a pele mais negra no topo da sociedade, em um papel que não seja o de capitão-do-mato, como Joaquim Barbosa, não existe justiça no Brasil. Mas podíamos começar pela conhecimento real da nossa história. É necessário que esse filme se prolongue em artigos e discussões entre os brasileiros. Ele é o vislumbre do que temos sepultado. Vejam o filme e releiam a história escura, oculta da escravidão. O filme é melhor do que os livros de sociologia escritos no Brasil até hoje.